terça-feira, 24 de março de 2015

Longevidades

Gosto quando as pessoas morrem dentro dos limites do seu direito natural de se irem embora. Faz-me sentir respeitado. A morte é um absurdo, que fique claro. Em qualquer circunstância, um absurdo. É igualmente um destino que os homens acataram há já muito tempo e que não voltaram a desafiar. Aceitou-se unanimemente que morremos todos mas eu olho e, agora mesmo, estamos vivos mais de sete mil milhões e eu recuso-me a perder a esperança de que, de entre tanta gente, não haja um ou dez ou cem ou até talvez dez mil que recusem o absurdo da morte e se mantenham vivos, contrariando perpetuamente as unanimidades, as tradições e o desperdício. Indefinidamente vivos. Nem tem de ser ser para sempre, só precisa de ser exagerado, para marcar uma posição. Dizem que na China havia um mestre taoísta que viveu mais de duzentos e cinquenta anos. É pouco, se pensarmos que escreveram na Bíblia sobre pessoas que quase chegaram aos mil - que continua a ser pouco. A não ser que sejas poeta. Sei de poetas que morreram e sobreviveram até à morte das línguas-mães dos seus poemas. Um poeta pode morrer descansado, desde que respeite os limites do seu direito natural de se ir embora.

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